É
graças aos sentidos que comunicamos com o mundo exterior. Em relação ao
olfacto, e apesar de ter sido considerado um dos sentidos de que se
poderia prescindir sem alterar a nossa percepção da realidade, ele é o
mais rápido a “pôr o cérebro a funcionar”, transportando-nos para um
mundo de emoções e sentimentos distintos e mais profundos do que o que
nos é sugerido pela visão de uma imagem ou a percepção de um objecto
através do tacto.
As primeiras referências ao
perfume remontam às antigas civilizações do Próximo Oriente,
especialmente ao Egipto. Os arqueólogos encontraram vasos de perfume de
alabastro que remontam ao terceiro milénio antes de Cristo, e são
numerosos os frescos com cenas da vida quotidiana que mostram rituais do
perfume.
O
culto do perfume no antigo Egipto era tão marcado que chegavam a ser
montados autênticos laboratórios nos templos, para a preparação das
fragrâncias utilizadas para os mortos e para os deuses. No laboratório
do templo de Horus, em Edfo, por exemplo, foi encontrada a receita de
velas perfumadas, fabricadas a partir de sebo embebido em drogas
aromáticas, que eram queimadas como oferenda às estátuas das divindades.
Os egípcios acreditavam que os seus pedidos e orações chegariam mais
depressa à morada dos deuses se viajassem nas densas nuvens de fumo
aromático que se erguiam dos altares e ascendiam aos céus.
Já
Cleópatra era uma fervorosa utilizadora de perfumes, assim como de
outras receitas de cosmética naturais, sendo considerada uma das
primeiras mulheres a utilizar o perfume como “arte de sedução”.
“Perfumes embriagadores flutuavam...”, escreveu Plutarco para descrever o
momento em Marco António entrou no barco da rainha em Tarso e
imediatamente se apaixonou por ela.
Também os assírios e os
babilónicos apreciavam as essências proporcionadas pelas resinas de
certas árvores provenientes da Índia e outros países asiáticos, que
importavam em grandes quantidades. Dos Himalaias recebiam a alfazema,
uma planta herbácea de cujas flores se extraía a fragrância que Plínio,
séculos mais tarde, definiu como “o perfume por excelência”.
Na
misteriosa Mesopotâmia os perfumes desempenhavam um importante papel na
vida conjugal e o marido devia proporcioná-los à esposa, tanto como
acto de amor, como para rituais de purificação. Toda a população usava
óleos, cuja qualidade dependia da condição social de cada um, sendo que
os mais abastados podiam utilizar finos óleos de murta e cedro.
Já
as informações de outras civilizações quanto a hábitos quotidianos de
utilização de perfumes não são muito precisas. Por exemplo, da Pérsia
existem referências contraditórias, pois enquanto para alguns
historiadores a utilização de perfumes relacionava-se com a tentativa de
mascarar os odores intensos de corpos a quem se presta poucos cuidados
de higiene, outros encontram relatos de uma utilização intensa e
refinada. No entanto, este império não marcou esta história e houve que
esperar que as civilizações grega e romana florescessem para que a
manufactura de perfumes crescesse como forma de arte.
Os
perfumes sempre desempenharam um papel importante na mitologia Grega.
No séc. IV a. C. Alexandre, o Grande, trouxe os perfumes para a Grécia,
que cedo se tornou uma fervorosa adepta destas substâncias. Nos dias de
luxúria grega, os perfumes tinham um valor tão elevado que quase
igualava o valor dos alimentos e foram usados de formas até então nunca
praticadas. Por exemplo, a sua famosa bebida continha mel, vinho, mas
também flores doces e perfumadas e até mirra, o que dá uma ideia de quão
viciados em perfumes os gregos eram, levando o seu uso a extremos.
A
arte da perfumaria floresceu nesta civilização. Foram desenvolvidas
fragrâncias específicas para cada parte do corpo e outras para o
tratamento de diversas doenças. Teofrasto, nascido a 370 a. C. terá sido
o primeiro grego a escrever um tratado sobre perfumaria, a partir dos
seus vastos conhecimentos em Botânica. É através deste documento que se
sabe que os óleos utilizados nesta época eram produzidos a partir de
flores e esta é a primeira referência conhecida a óleos florais na
história do perfume.
A perfumaria também se encontra, desde a
Antiguidade, ligada à ciência médica. Na Grécia Antiga, Hipócrates,
conhecido como o “pai da medicina”, utilizava pequenos concentrados de
perfume para combater certas enfermidades.
Contudo,
terão sido os romanos, preocupados com o asseio pessoal diário, que
lançaram o consumo dos perfumes a todos os escalões da sociedade. Foram
pioneiros a desenvolver óleos para a limpeza do corpo e para a
preparação de rituais de fertilidade, assim como a desenvolver
diferentes consistências nas substâncias aromáticas, como pastas, óleos,
incensos e colónias. Utilizavam bálsamos cicatrizantes e utilizavam
perfumes nas roupas para espantar as epidemias.
Quando
foram descobertas as ruínas de Pompeia o trabalho dos arqueólogos
trouxe à luz uma perfumaria, onde foram encontradas garrafinhas de
perfume com resquícios dos seus conteúdos mágicos. Depois de análises
diversas, os mistérios dos perfumes com mais de 2000 anos foram
revelados. Verifica-se que são todos à base de azeite, no qual as
plantas, como pétalas de rosas, lírio ou manjericão, eram maceradas.
Como não utilizavam fixadores, depois de meia hora de utilização o que
ficava mesmo era o cheiro a azeite!
Com
a chegada do Cristianismo e as suas mensagens de humildade e pudor, o
perfume caiu em desuso. Terá sido a civilização árabe a “investir” em
experiências com perfumes, que pretendiam extrair as propriedades das
plantas, a sua essência química. Desta forma, a planta seleccionada era
destilada uma infinidade de vezes, até que as suas qualidades passassem a
um outro estado. Com a chegada dos árabes à Península Ibérica, a
perfumaria expande-se novamente pelo resto da Europa. Os países
mediterrânicos, com um clima adequado ao cultivo de plantas aromáticas,
principalmente o jasmim, o alfazema e o limão, viram as suas costas
ocupadas com plantações, cujas flores e frutos eram aproveitados pelos
árabes na produção de perfumes, a sua principal ferramenta de comércio.
Os
perfumes foram também introduzidos no Japão, através da China, que já
tinha desenvolvido grandes artesãos da jardinagem para perfumaria. Neste
país reconhece-se grandes poderes aos perfumes e o sentido do olfacto,
sempre desprezado em relação aos outros sentidos, é colocado na posição
de relevo que lhe pertence.
Voltando
à Europa, e apesar de na Idade Média a utilização de perfumes estar
condicionada pela pressão da Igreja, ela continuou nas classes mais
favorecidas. Com a ausência de cuidados de higiene, as mulheres
perfumavam-se com fortes e persistentes aromas, como âmbar. Nos castelos
aromatizavam-se alguns compartimentos, nascendo, assim, o primeiro
ambientador da história.
Mas o primeiro perfume como fórmula
própria, de que se tem conhecimento, surgiu em 1370, criado pela Rainha
Elisabeth, da Hungria. Era uma concentração de óleos e essências,
conhecido como
l’eau de la reine de Hongrie.
Embora a
tradição da perfumaria em França venha já do séc. XIII, quando foram
criadas as primeiras escolas que formaram os aprendizes e oficiais desta
profissão, foi após a Revolução Francesa que se conheceram
desenvolvimentos impressionantes. Tinha chegado ao fim a história do
perfume apenas como composições restritas a águas tratadas com flores e
começam a aparecer fórmulas que combinam aromas de couro, almíscar e
musgos. Nesta época o perfume começou a ser associado à sedução e mesmo
ao erotismo. Assim, a partir do séc. XIX, a história deste produto
começou a caminhar de mãos dadas com a moda. França é reconhecida como o
berço da perfumaria e Paris como o centro da indústria do perfume.
Entretanto
o desenvolvimento não pára, especialmente ao nível técnico. Até aqui a
maioria dos perfumes era extraída de substâncias aromáticas contidas nas
plantas. Com os avanços científicos, uma pequena revolução nos
laboratórios começou a mudar a história dos aromas: compostos sintéticos
reconstituíram aromas naturais e criaram-se mesmo novas fragrâncias.
Pôs-se fim a um dos maiores problemas da indústria perfumista – a
estabilidade. Este é um grande passo, que os ambientalistas agradecem –
hoje não é preciso colher ao amanhecer quilos de flores, para extrair
uma fragrância exótica.
Por
volta de 1920, com o advento da química orgânica, começaram a surgir as
fragrâncias como hoje as conhecemos. A partir daqui, a cada revolução
na indústria da moda, que ditava novas tendências, a indústria química
dava uma resposta e alguns perfumes começaram a marcar épocas.
Para
além da evolução técnica, foi igualmente ocorrendo uma evolução nas
preferências dos consumidores, e existem épocas marcadas por tendências
florais, outras mais cítricas, ou mais exóticas, tendências essas que se
vão alternando até chegarmos aos nossos dias.
Relativamente aos
processos de fabricação dos perfumes, eles foram evoluindo
consideravelmente ao longo da história, e apesar de actualmente a maior
parte se centrar na produção sintética de aromas, ainda hoje são
utilizadas algumas técnicas antigas que sempre deram bons resultados. É o
caso da maceração, em que flores são colocadas dentro de misturas de
gorduras animais cozidas e purificadas, para que estas fiquem
impregnadas com os seus odores. Para os chamados óleos essenciais,
utiliza-se a destilação para arrastar no vapor da água as substâncias
odoríficas de materiais naturais (flores, folhas, raízes e madeiras).
Para extrair óleos essenciais de citrinos é utilizada a técnica da
compressão da casca, que permite a libertação das moléculas voláteis
odoríficas. A técnica da exsudação é utilizada com árvores que possuem
resinas, posteriormente tratadas com álcoois.
A
partir destas matérias-primas secundárias são fabricados diversos
produtos, que vão desde os perfumes enfrascados que utilizamos
diariamente, até aos ambientadores para as nossas casas, passando por
uma infinidade de produtos, como bálsamos, desodorizantes, óleos e
leites corporais, pós de talco, géis de banho, maquilhagem, etc., assim
como produtos de “capricho” – papel, velas, tintas e uma infinidade
inimaginável de produtos, todos eles perfumados.
http://naturlink.sapo.pt/Natureza-e-Ambiente/Interessante/content/A-historia-do-Perfume?bl=1&viewall=true
Lia Pedrosa